sábado, 6 de setembro de 2008

MEMÓRIA MUSCULAR E VISCERAL (por Silvio Porto).
Uma das descobertas importantes da neurociência refere-se ao funcionamento da memória: as estruturas cerebrais essenciais para a formação de memória consciente não funcionam durante os primeiros dois anos de vida. As vivências desse período não ficam registradas no cérebro, mas no corpo. A memória está nos olhos, na boca, nas vísceras. A constatação mostra que Freud também estava certo ao dizer que “o eu é acima de tudo corporal”, em “O Ego e o Id” (1923). E explica ainda o que Freud chamava de amnésia infantil (ou recalque primário). Hoje, os neurocientistas mostram que esse período não foi esquecido; na verdade, não vêm à consciência porque, quando foi vivido, não foi registrado pelo cérebro, que não estava pronto.

“É interessante que a psicanálise, negada como ciência, seja cientificamente comprovada por neurologistas cognitivos” – diz o psicanalista Joel Birman (do Rio de Janeiro). Ele considera esta comprovação importante para que alguns psicanalistas percebam que, sem uma abordagem afetiva, que dê acesso à memória corporal, não há tratamento psicanalítico, conforme suas próprias palavras: “Uma parcela significativa da psicanálise esqueceu que o psíquico é corporal. Foi por isso que as chamadas terapias corporais, como a bioenergética e as reichianas, ampliaram-se tanto em todo mundo, nas últimas décadas”.
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AS IDÉIAS DE FREUD COMPROVADAS EM LABORATÓRIO.
A teoria freudiana da estruturação do psiquismo, de 1933, fugia da anatomia cerebral da época. Para Freud, o sistema psíquico era formado pelo inconsciente(id), fonte dos impulsos e da motivação dos seres humanos. Boa parte desses impulsos eram limitados pelo consciente (ego), para impedir que eles comprometessem o pensamento racional. Havia também o superego, uma estrutura que intermediava os conflitos entre o ego e o id, constituída em boa parte pelas leis da cultura. Quando essa repressão não funcionava bem, segundo Freud, ocorriam as fobias, o pânico, as obsessões, os ataques histéricos, a psicose etc. A psicanálise teria então a função de trazer o inconsciente à consciência, elaborando o que exatamente deu origem às ações inconscientes.

Os mapeamentos neurológicos recentes combinam com as concepções de Freud:
1) O tronco encefálico reticulado e o sistema límbico, responsável por instintos e impulsos, correspondem ao id freudiano.
2) Na região frontal ventral, que lida com a inibição consciente e seletiva desses impulsos inconscientes, estaria a repressão proveniente do ego.
3) Na região frontal dorsal, que controla as funções conscientes, estaria o superego e o ego também estaria no córtex posterior, que percebe o mundo exterior.
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As pesquisas mostram como a repressão de lembranças é deliberada e seletiva: danos na região parietal direita fazem com que a pessoa não perceba danos físicos, como a paralisia de um braço. Danos na região límbica frontal, que controla aspectos essenciais da consciência, por exemplo, faz com a pessoa invente histórias fantásticas a seu respeito, sem contatar imagens inconscientes que tem de si mesma. Hoje estes processos mentais inconscientes foram comprovados em laboratórios de neurocientistas (recomendo a leitura de O Mistério da Consciência, de António Damásio).

Freud chocou ao pensar o homem como um animal de instintos primitivos, sexuais, infantis e às vezes agressivos. Hoje a neurociência classifica o ser humano como um animal que, como todos os mamíferos, tem quatro circuitos cerebrais instintivos:
1º) o de recompensa e busca (do prazer), regulado pelo neurotransmissor dopamina e envolvido com os quadros de compulsão e vício;
2º) o de raiva e de agressões raivosas, não predatórias;
3º) o de medo e ansiedade;
4º) o de pânico, circuito cerebral que comanda os impulsos maternais e as relações sociais.

“A psicanálise ainda é a visão da mente mais satisfatória e coerente. As pesquisas prometem novos parâmetros para a psiquiatria”, afirma Eric R. Kandel.

Vamos, agora, juntar uma série de afirmações que fizemos nos parágrafos anteriores, com base, essencialmente, nas pesquisas relatadas dos neurocientistas.

Há muito tempo estudamos que Freud constatou que o ser humano é movido por impulsos inconscientes, que sofrem repressão para não se tornarem conscientes. Quando essa repressão não funciona bem, poderiam ocorrer ataques histéricos, obsessões, fobias, pânico e surtos psicóticos. Agora, o mapeamento do cérebro identificou que uma via neuronal sob o córtex consciente conecta a percepção presente com estruturas primitivas responsáveis pela geração de medo. Como essa via neuronal atravessa o hipocampo, acontecimentos presentes desencadeiam lembranças emocionalmente importantes, provocando sensações que parecem irracionais (memória emocional). Os neurocientistas também, com suas recentes pesquisas, vieram a confirmar que as experiências da primeira infância influenciam o padrão de conexões cerebrais que moldam a nossa personalidade e a saúde mental para o resto da vida. Essas referências são importantes de serem relembradas.

Na minha opinião, no entanto, a mais importante contribuição da neurociência refere-se ao funcionamento da memória: as estruturas cerebrais essenciais para a formação de memória consciente não funcionam durante os primeiros dois anos de vida. As vivências desse período não ficam registradas no cérebro, mas no corpo. A memória está nos olhos, na boca e nas vísceras. A neurociência comprovou em laboratórios que as experiências dos primeiros meses de vida entre mãe e bebê influenciam o padrão de conexões cerebrais de modo a moldar a nossa personalidade e a saúde mental futura. É verdade, a relação mãe-bebê é fundamental, mas não se pode esquecer, também, da importância da figura do pai na formação do caráter da criança.

Os neurocientistas comprovaram que as estruturas cerebrais essenciais para a formação de memória consciente não são funcionais durante os primeiros dois anos de vida. Esta memória ficou retida no corpo e, por ser anterior á formação completa do cérebro, não é articulada mentalmente (memória muscular e visceral). E explica ainda o que Freud chamava de amnésia infantil ou recalque primário. O que os neurocientistas comprovaram com suas pesquisas é que esse período não foi esquecido; eles não vêm à consciência porque, quando foi vivido, não foi registrado pelo cérebro (que ainda não estava pronto).

Alguns psicanalistas, ante o resultado destas recentes pesquisas, perceberam que sem uma abordagem afetiva que dê acesso à memória corporal, não há tratamento psicanalítico. Joel Birman afirma: “Uma parcela significativa da psicanálise esqueceu que o psíquico é corporal. Foi por isso que as chamadas terapias corporais, como a bioenergética e as reichianas, ampliaram-se tanto em todo mundo, nas últimas décadas”. Birman diz ainda que esta memória que não está concentrada no cérebro; será mantida a vida inteira nos olhos, na boca, no abdômen, nos dedos: “São as zonas erogenizáveis pela relação da mãe com o bebê. Nessa fase, o cérebro não tem ainda a mielinização das fibras nervosas e a memória se mantém no corpo”. É este o principal resultado das pesquisas desta nova ciência: NEUROPSICANÁLISE.

Um comentário:

Yoga Lotus - prática de yoga e estudo de Vedanta disse...

Bem, para qeum diz que no orkut não tem nada que preste, eu digo que essa pessoa não sabe usar o orkut. Esse texto é de um fórum do orkut.